Quem mora ou visita a cidade de Angicos, no Sertão Potiguar,
localizada a 169 quilômetros da capital, se não provou, certamente já
ouviu falar do pêlo, fruta nativa da caatinga comumente encontrada em
toda a região do semiárido. Exótica, a fruta é proveniente da palma, uma
espécie de cacto nativo, que tem se transformando em matéria-prima para
a produção de sorvetes.
A ideia vem de Kaline Cristine de Castro Felipe, empresária do
município de Angicos e dona da sorveteria Sertão Gelado. A fábrica é uma
das novas incubadas pela Incubadora Tecnológica e Multissetorial do
Sertão do Cabugi, na Universidade Federal Rural do Semiárido (Ufersa) -
Campus de Angicos, que faz parte do programa de Incubadoras do Sebrae no
Rio Grande do Norte.
“Temos como diferencial a inovação de
sabores aproveitando as frutas da região”, justifica a proprietária da
sorveteria. Além das frutas mais típicas da região, como manga, caju,
umbú e abacaxi, a novidade é o sorvete da fruta do pêlo.“Iniciarmos por sugestão de um vizinho, aceitei o desafio e quem
degustou aprovou a novidade”. A sorveteria também já testou outros
sabores regionais com sucesso, como milho, tapioca e rapadura.
Atualmente, a empresa tem uma produção mensal de 750 litros de sorvetes e
6,5 mil picolés de diversos sabores.
A utilização do pêlo remete a uma tradição antiga dos moradores da
cidade que tinham o hábito de consumir a fruta in natura com açúcar.
“Quem é de Angicos conhece o pêlo e as muitas histórias envolvendo a
fruta. Para reconhecer um angicano, basta olhar embaixo da língua para
vê se tem pêlo, se tiver, não resta dúvida, é de Angicos”, brinca a
empresária.
De sabor azedo, a fruta possui uma polpa carnuda que também pode ser
utilizada na produção de geleias, mousses e recheios em caldas. O quilo
chega a custar R$ 10. O preço alto é devido à dificuldade no
beneficiamento. O fruto deve ser manipulado com cuidado uma vez que a
sua casca possui muitos pontinhos cheios de minúsculos espinhos, os
pêlos, que penetram na pele.
Para retirá-los se faz necessário o uso de uma pinça. Em toda a região
Nordeste, a planta – palmatória ou palma forrageira – é utilizada como
alimentação para os animais no período de seca. Em alguns estados, essa
fruta é conhecida como figo da índia.
O desejo de montar o próprio negócio motivou a empresária a entrar no
ramo da produção de sorvetes. Como acontece com a maioria dos donos de
micro e pequenas empresas, as dificuldades eram proporcionais à vontade
de vencer. “Começamos produzindo picolés para vender na escola, para
depois fabricar o sorvete. Nem liquidificador nós tínhamos e todos os
primeiros equipamentos foram comprados de segunda mão”, conta Kaline de
Castro.
A empreendedora teve a convicção de que estava no caminho certo ao
participar, em 2010, do seminário Empretec. Posteriormente, a sorveteria
passou a ser atendida pelo programa Agentes Locais de Inovação (ALI),
desenvolvido pelo Sebrae no Rio Grande do Norte para levar inovação
tecnológica ao setor industrial.
A empresária também participou de cursos promovidos por fabricantes de
maquinários para a produção de sorvete. Kaline de Castro procurou a
Ineagro Cabugi para aprimorar o seu produto e conquistar o mercado
regional. “O crescimento com qualidade é a minha meta”, afirma. Ela
garante que os sorvetes do Sertão Gelado têm obtido boa aceitação e a
fruta do pêlo veio para ser o grande diferencial, além de levar o nome
de Angicos para outras localidades.